"Eu juro...que não darei a nenhuma pessoa remédio mortal, ainda que seja por ela pedido, nem darei conselhos que induzam à destruição..."
Essa frase é uma passagem do juramento médico, feito no ato da formatura. É um compromisso ético assumido, para exercício de uma das mais importantes e conceituadas profissões.
A denúncia que faço hoje é em relação ao despreparo, ou seria mais correto afirmar 'descaso', que alguns médicos têm, em relação à pacientes com problemas de alcoolismo. Considerado uma doença crônica, inclusive em muitos casos pode ser decorrente de uma herança genética (hereditário), fatores psicológicos (depressão, conflitos emocionais, baixo auto-estima) e sociais (fácil acesso a bebida, estilo de vida estressante), enfim, várias são as causas que podem levar à dependência química.
Pude presenciar, dentro de um hospital conceituado fundado há 51 anos, a forma humilhante como são tratados quem apresenta esse tipo de patologia.
Através de um convênio particular, um dos melhores existentes atualmente, um paciente deu entrada com crise de cirrose hepática. Após, uma semana de internação recebeu alta, mesmo sem condições físicas, e isso era visível a qualquer leigo.
Com extrema grosseria e sem nenhum tato para abordar o problema, a médica afirmou que não poderia mantê-lo por mais tempo em internação, pois, o tratamento estava ficando muito caro. Que só de albumina (medicamento usado em tratamentos de cirróticos) foram ministradas três doses, e uma vez que o organismo não respondia de forma imediata, nada mais seria feito.
O paciente, sentindo ainda fortes dores, argumentou que não tinha condições de trabalhar. Em outras palavras, e com o tom de voz irônico e extremamente exaltado (quase aos gritos), a Dra. simplesmente o chamou de vagabundo, ao insinuar que aquilo era desculpa para conseguir um atestado, que ele tinha acabado com o fígado, que era um alcoólatra e que o problema dele deveria ser solucionado dentro do AA (Alcoólicos Anônimos).
Funcionário concursado há mais de 30 anos, cidadão idôneo, nunca perdeu um dia sequer no serviço (exceto agora com sua enfermidade), nem faltou com suas obrigações familiares, embora tenha o vício da bebida.
Mensalmente é descontado diretamente de sua folha de pagamento o convênio médico de primeira linha, inclusive o tratamento com a albumina (80%) é coberto pelo plano de saúde, os 20% restantes é pago por fora.
Conclusão, o paciente já fragilizado pelo estado de saúde, entrou em depressão (passou a não conversar, nem se alimentar de forma adequada, mostrava uma tristeza aparente) e debilitado, pois, não estava bem o suficiente para receber alta, entrou em coma dois dias depois. Internado dessa vez no Hospital Santa Cruz, o quadro de coma foi revertido, embora ainda esteja na UTI, tem recebido os devidos cuidados e intervenções médicas.
Fico pensando que se um portador de cirrose hepática (por uso abusivo do álcool) é humilhado dessa forma degradante, que dirá de um paciente homossexual HIV positivo? Que tipo de absurdos ele terá que ouvir para receber um tratamento médico adequado?
Sim, pois, este não é o primeiro caso que pude constatar. Já ouvi outros relatos de humilhações, que pacientes com determinadas 'doenças' são submetidos.
Até onde minha ignorância sobre o assunto permite, sei que não cabe ao médico julgar o paciente (credo, raça, opção sexual, etc) tampouco sua patologia, sua obrigação é com a saúde humana.
Julgamentos ou contrangimento moral, não é pertinente à suas atribuições médicas. Se a sugestão para que o paciente procurasse um grupo de apoio a dependentes do álcool, ocorresse de forma branda e com muito tato, seria até um conselho válido. Mas, o que mais indignou a todos, foi a crueldade e o tom discriminatório com que o assunto foi abordado.
Não estou generalizando a situação, pois, sei que existem profissionais da medicina que desempenham brilhantemente sua função e ainda que o dia-a-dia os tornem frios diante de tantos problemas, muitos ainda conservam o lado humanitário.
Cito um constrangimento ilegal e psicológico ocorrido dentro de um hospital (seja particular ou público), coisa inadmissível.
Acesso a saúde é um direito de todo cidadão. De acordo com a Constituição Federal de 1988, artigo 196 “não ser discriminado, nem sofrer restrição ou negação de atendimento, nas ações e serviços de saúde, em função da idade, raça, gênero, orientação sexual, características genéticas, condições sociais ou econômicas, convicções culturais, políticas ou religiosas, do estado de saúde ou da condição de portador de patologia, deficiência ou lesão preexistente".
Obs.: A identidade do paciente, do hospital, bem como nome da médica e CRM estão sendo preservados, pois, as devidas providências serão tomadas pertinentes a este caso.
Infelizmente há muitos profissionais que lidam com o público que acabam contraindo essa doença social que é a deshumanização nas relações com os outros seres humanos. Não temos culpa disso, é um efeito desse sistema que controla e exerce influência no comportamento do individuo dentro dele. Outro mal, esse que atinge muito mais pessoas, talvez em escala até global, é do sub-entendido, das conclusões preciptadas, o que acaba gerando preconceitos, como podemos constatar no caso que citou. Torcemos para que haja profissionais melhores por ai, que saibam lidar com pessoas...mas não podemos ficar na torcida temos que agir também.
ResponderExcluirOlá!
ResponderExcluirRealmente é um absurdo esse descaso que fazem, aidna mais os médicos que tratam com a vida, o bem mais precioso.
Gostei muito do seu texto e vou enviá-lo para alguns amigos meus. Espero que seu blog continue, pois é muito legal.
Gostaria de convidá-la a escrever um texto sobre o tema da semana do meu blog (Televisão) e enviá-lo para nosso e-mail. Ele poderá ser escolhido e postado.
Abraços fraternos,
www.descargapublica.blogspot.com